Verdade.

Durante o sono, o sentido da audição permanece ativo captando possíveis sinais de perigo. Enquanto dormimos, perdemos a interação visual ao fecharmos os olhos, fato que nos torna suscetíveis a predadores, por exemplo. Evolutivamente, a percepção de ruído durante o sono foi um mecanismo importante de proteção da espécie. Este processo será mais exuberante ou não, dependendo da fase de sono que se pronuncia. No período da noite, há uma redução acentuada do ruído do ambiente, o que permite que qualquer barulho possa ser percebido mais facilmente. Sabe-se que sons com média de 30dB são suficientes para causar alterações eletroencefalográficas e provocar despertares, geralmente de curta duração. 

Os impactos dos ruídos no sono incluem aumento do tempo de vigília após o início do sono, diminuição do estágio N3, em contraste com o aumento da porcentagem das fases N1 e N2, além da sensação de sono não-reparador. 

É indiscutível que o controle de estímulos durante a noite é fundamental para que o sono ocorra sem interferências externas. Além da luminosidade, que atua de forma substancial no atraso da liberação de melatonina, a redução de estímulos sonoros exerce igual importância nas conhecidas medidas de higiene do sono. Neste cenário, é uma verdade incontestável que a exposição sonora pode interferir e até mesmo comprometer a qualidade das noites de descanso, como o início e a manutenção do sono. Portanto, não é mito! 

MITO 

Porém, todo estímulo sonoro é um vilão para o sono? Curiosamente, a ciência está cada vez mais convencida de que não é bem assim. 

Novas pesquisas investigam frequências de sons que poderiam ser promotoras de melhor qualidade de sono. Por exemplo, o “pink noise”, uma espécie de ruído branco atenuado, pode ser utilizado para mascarar o som de baixa frequência do ambiente. No local de trabalho, age aumentando a concentração e a produtividade. No quarto, promove relaxamento e favorece o início do sono. 

Recentemente, foi publicada uma pesquisa em que foi avaliada a influência da estimulação acústica na memória durante o sono. Enquanto os participantes dormiam, foi emitido um estímulo sonoro conhecido como “pink noise” através de um fone de ouvido binaural, sem que isso fosse por eles percebido conscientemente. Ao final do estudo, foi demonstrado a presença de sono de ondas lentas imediatamente após o início do estímulo acústico. Os autores observaram maior consolidação da memória após exposição a esta modalidade sonora. Outra pesquisa demonstrou que a exposição à estimulação acústica rítmica durante o sono de ondas lentas, durante 12 segundos, a uma taxa de 1Hz em alternância com períodos de silêncio, aprimorou a potência do estágio N3 durante os cochilos. Esse fenômeno foi observado três a quatro segundos após o estímulo sonoro. Entretanto, a manifestação da atividade oscilatória de ondas lentas ocorreu nos dois hemisférios cerebrais, independente do lado da via auditiva estimulada. 

Estamos diante de novas perspectivas para potencializar a qualidade do sono. Será que a estimulação acústica com frequências de ondas sonoras adequadas é uma opção no arsenal de terapias na Medicina do Sono? Ainda necessitamos de mais pesquisas com aplicabilidade clínica para confirmar essa suposição. Neste sentido, os estímulos sonoros poderão deixar a categoria de vilões e atuar como adjuvantes no tratamento das queixas de quem dorme mal. 

…..

Dr. George do Lago Pinheiro é médico otorrinolaringologista, com atuação na área da Medicina do Sono. REFERÊNCIAS: Pimentel-Souza, F. Os riscos ao sono. Revista Proteção, v.5, n.23, p.148-154, jun./jul. 1993. Choi, Jinyoung & et al. (2018). The Neurophysiological Effect of Acoustic Stimulation with Real-time Sleep Spindle Detection. Conference proceedings: Annual International Conference of the IEEE Engineering in Medicine and Biology Society. IEEE Engineering in Medicine and Biology Society. Conference. 2018. 470-473. 10.1109/EMBC.2018.8512323. Simor, P. et al. Lateralized rhythmic acoustic stimulation during daytime NREM sleep enhances slow waves, Sleep, Volume 41, Issue 12, December 2018, zsy176, https://doi.org/10.1093/sleep/zsy176.

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